Revisitando Castelo Branco

23/10/2011

Crónicas do Regedor: O mapa da mina.

Autor: Arlindo Parreira

Imagem do mapa

Pensavam que estava esquecido, mas um regedor é, e será sempre um regedor.  Creio que é algo assim do tipo: Quem é rei nunca perde a majestade! É ou não é?

Para os admiradores, aqui vai mais uma crônica, para os que não o são, recomendo que parem por aqui esta leitura, não quero ser culpado de macular tão sensíveis e virginais olhos.

Como todos sabem a rodela era o pentágono onde os capitães e generais do gamanço tinham o seu quartel secreto, mas não era o único. Havia outros, como este, de que vou falar agora. Um lugar  que tinha o segundo grau de importância estratégia das tropas. “Pirocas” um nome conhecido, mas com um significado muito maior para os iniciados em tão distintas artes, estes guerreiros podiam bem ser comparados aos templários pela vontade férrea de vencer, mas silenciosos como as cobras quando em ação nunca se deram ao trabalho de fazer tal comparação.

Pos é pasmem! Tínhamos mais de um local secreto.

O ritual de iniciação era todo ele realizado neste quartel pirocas. Nele os generais instituiram  a base de treinamento dos recrutas, tudo feito com muito rigor e dedicação. Pirocas, era tambem como um código que só era dado para o recruta depois de ter passado a pronto. 

Provas muito rigorosas eram feitas  para  testar a capacidade da malta recrutada. Quem passava nos testes recebia a chave e o código de entrada para o pirocas junto com um mapa dos galinheiros. Juro que se houvesse GPS naqueles tempos teriamos sido a maior e mais precisa tropa de elite do distrito de Bragança. Mas, para a ocasião em que foi, já fomos muito além. As nossas armas eram umas bengalas de mamarmeleiro. Armas letais quando postas em ação dentro dos galinheiros.

Nao pensem que treinar no pirocas fosse mole não. Os nossos instrutores eram muito exigentes. Para gamar uns pirus e umas pitas, era preciso saber a idade e estado de saúde das aves escolhidas, nada de gamar galinha ou pirua choca, não podiamos permitir que a espécie acabasse. Era um exército com muita consciência ecológica. Outra regra importante: não era permitido trabalhar por conta própria, só com autorização e acompanhado dos mais velhos.

O Pirocas éra um lugar tranquilo. Todas as tardes na varanda, o silêncio era cortado pelo cantar das rãs e dos grilos e o perfume da noite transformavam este lugar em local de sonho romântico. O belo amanhecer pelo orvalho da manhã enquanto cantavam os pássaros no extenso arvoredo.

O Pirocas tinha cerca de 3 hectares de terra fértil, avermelhada da cor do sol-posto, onde dava de tudo: batata a murro, xixa assada, bacalhau com grãos, toucinho, pita frita, pita assada, pita cabidela, pita com piripiri, xouriça defumada, frutas de toda a qualidade.

Ao fundo do Pirocas, o choupal perto da fonte que oferece uma sombra fresca saudável, todo rodeado do grande poço com peixes das mais variadas qualidades tamanhos e cores, tinha até congrio e xixarros com pimentos.

Este paraíso foi sempre o lugar preferido para os estudantes escreverem os textos e poemas para o portal de Castelo Branco. E claro que nao podia deixar de ser, muitas as pitas e piruas foram depenadas nesse jardim do eden e regadas a suaves goles do vinho da terra.

Como se passaram muitos anos e a tropa foi dispensada, só agora pude revelar o segredo do local exato onde tudo isso acontecia.

Nos tínhamos uma propriedade no caminho de quem vai para a devesa  a que chamamos boca das bouças,  tinhamos lá uma horta e um olival e era nesta beleza de sitio que fiziamos nossos muitos faditos.

Aos meus amigos de sempre. em exaltada memória, muitos abraços!

E como quem conta um conto aumenta um ponto, e eu sou atentado, já o sabem, fiz meus aumentos. Memórias são assim mesmo. São de cada um que as quer contar.

De Toronto para o Portal de Castelo Branco, o último regedor de Castelo Branco:

Arlindo Parreira.

12/10/2011

O Rosto da Fé.

Autor: Arminda Neto

Rosto? Fé? Mas, a fé tem rosto?

Sendo Jesus a dar-nos a resposta, hoje, seria certamente, esta: “Tem, a comunidade de Castelo Branco.”

“ Eu sou a videira e vós sois os ramos.” O resultado vê-se nas horas de trabalho que cada um de nós tem na Sua vinha."

As palavras que se seguem são ditadas pela voz do interior e integram um sentimento de admiração pelo agir do povo de Castelo Branco. Entre pareceres desencontrados, mágoas, distâncias, no final a resposta é: “estamos cá, vamos a isso, contem connosco.”

A nossa vida por cá é um treino constante; treinam-se os valores, as atitudes, os pensamentos, as contrariedades, as amizades e … dos treinos resultam as aprendizagens. O percurso não é fácil a não ser que façamos uma das melhores opções: usufruir dos ensinamentos de Deus, como uma rotina interiorizada. Também Jesus tem rotinas; uma delas é bater todos os dias à nossa porta, sempre com um propósito:”Se abrires, Eu entro e terei um lugar cativo no teu coração”… porque… “ Eu sou a videira e vós sois os ramos.” O resultado vê-se nas horas de trabalho que cada um de nós tem na Sua vinha.

O povo de Castelo Branco não se tem poupado a esforços para cuidar das propriedades que, sendo do Senhor, são suas. Assim, ter fé, é ter certezas, é saber sentir a necessidade no momento certo, é procurar a resposta que soluciona. É o que acontece em Castelo Branco. Consideravelmente gente do povo nas suas origens, na ausência de privilégios sociais, é de louvar a humildade, a camaradagem, a fortaleza e a grandeza de coração, valores tantas vezes materializados. Estas qualidades, passando de geração em geração e vividas à época, vão fazendo o curso da nossa história, moral e física.

Hoje, dia 9/10/2011, com uma feijoada comunitária para angariar fundos para as janelas da Igreja, foi assim. A afluência foi massiva. “O povo está cansado de tanto dar! Sempre a pedir, sempre a pedir! São expressões que as bocas libertam mas que o coração não dita pois vai-se respondendo sempre ao apelo. A voz que chama sabe convencer. Não vem daqui ou dali, vem do Alto, cheia de sabedoria e, através dos que já vêm aprendendo a escutar, consegue chegar aos ouvidos de muitos. Como resultado temos um povo unido que tem feito prodígios. Com Nª Sª da Vila Velha e S. Bernardino como escudos alistam-se os soldados nas batalhas, conseguindo-se grandes vitórias no património religioso da nossa paróquia. Vai certamente ser assim com a restauração da nossa igreja. Vamos conseguir, como sempre. Sem promessas mas com um agir conducente ao abreviar das obras em que no final todos vão ficar bem. Adensam-se os generosos e solidários com contributos gratificantes em dinheiro, em trabalho, em divulgação apelativa, em levar para o terreno a união e o entendimento.

Lá está, a certeza da fé que só se consegue pelo diálogo, pela partilha e pela evidência da lealdade e, neste caso pelo estômago, deliciando-se com a mega feijoada “lucrativa”.

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Com um olhar saudoso sobre os que já partiram, mas sempre presentes e que tanto defenderam estas causas; com a presença no coração dos filhos da terra (defensores dessa filiação) que se encontram ausentes; com a presença dos residentes em Castelo Branco, manifestando mais uma vez a sua generosidade viveu-se este dia na graça de Deus, sempre com Ele a supervisionar. Tenho a certeza, como também tenho de quão os albicastrenses merecem estas palavras.

Há imagens para partilhar? Certamente…

Arminda Neto

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02/10/2011

TRITEIROS

Autor: Dulce Pombo

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As tardes lentas traziam o enfado de qualquer aldeia de Trás-os-Montes, que se projectava numa noite curta de quase nada para fazer.

Os ventos soavam no asfalto estreito da Casa Grande a cada carro que passava na cadência do tempo lento que acompanhava as sombras do sol que se punha.

De quando em quando, forasteiros resolviam parar em busca de algo que nunca encontravam na aldeia tendo que seguir até à vila.

De entre os que por ali paravam, nem todos partiam. Havia uma família que visitava a aldeia depois de já ter pernoitado em outra aldeia vizinha.

Os Triteiros.[1]

Saltimbancos de necessidade, olhares de fome e roupas que lembravam caminhantes de pó! Vinha o pai, a mãe e as crianças. Todos eles da escola da arte que a necessidade fez.

Eram bem-vindos porque quebravam a monotonia das tardes lentas e das noites curtas.

Depois de anunciada a sua chegada pelo meu primo Virgílio [2] que levava a novidade até ao vale, dali seguia por todo o povo.

Pela noitinha seguíamos com um banquinho até à praça, a sala de espectáculo ambulante que nos traria as mais difíceis aventuras do arame e dos malabarismos aprendidos á custa da força de ser nómada.

Ali sentada me lembro da boca de espanto que eu e outros miúdos fazíamos ao som de tamanhas habilidades. Imagens que me fazem viajar como viajei ao ler livros de Garcia Marquez. Se aqui na minha aldeia os Triteiros chegam e partiam, também em outras terras e outros continentes o mesmo acontecia.

Triteiros que entretinham não só por arte ao oficio mas pela necessidade de ter uma terra só sua, por uma noite sem olhares soslaios de quem não gosta de forasteiros.

Nómadas amados numa praça cheia de traquitanas que se embalavam no dia seguinte. Generosidades albicastrenses que caiam num chapéu de gratidão.

Trocas justas e recíprocas.

Era assim que se passava a distracção de uma noite curta na minha aldeia!

Texto de Dulce Pombo

[1] Homens de Circo no dicionário Albicastrense

[2] Honro aqui o seu nome e a saudade da sua imagem

01/10/2011

MARIA

Autor: António José Salgado Rodrigues

 

De manhã, ao acordar

Olhei a ver se te via.

Julguei que fosse a sonhar

Pois não te vi a meu lado… MARIA.

 

Levantei-me, dormitando

Não era bem o que queria,

Caminhei, fui andando

Julgando que te encontrava…MARIA.

 

Abri a porta devagarinho

Vagueei… nada me sorria.

Saí do quarto, e com carinho

Agarrei a tua imagem…MARIA.

 

Ao descer as escadas, triste ilusão.

Reparei que teu olhar sorria.

Estremeci… bateu-me o coração,

Estava mesmo a sonhar… MARIA.

 

Triste sonho , sonho triste

Tão triste quem o diria!

Ninguém à tristeza resiste

Como posso viver sem ti… MARIA.

 

António José Salgado Rodrigues – 1986

COMPRIDOS E ONDULADOS

Autor: António José Salgado Rodrigues

 

COMPRIDOS E ONDULADOS

 

COMPRIDOS E ONDULADOS

COMO EU GOSTO DE VER

SÃO TÃO LINDOS E DOIRADOS

QUE POSSO MAIS QUERER?

 

Ao esvoaçar com o vento

Como muitos dos toucados,

Faz-me lembrar outro tempo,

COMPRIDOS E ONDULADOS.

 

Doirados, resplandecentes,

Nunca deixes de os ter.

São como estrelas cadentes

COMO EU GOSTO DE VER.

 

Nunca os cortes, eu suplico

Por alma dos meus pecados.

Ao vê-los, parado fico…

SÃO TÃO LINDOS E DOIRADOS.

 

Cuida deles com amor,

Enquanto pra ti viver.

Suavizam minha dor,

QUE POSSO MAIS QUERER?

 

Bragança em 1956,

António José Salgado Rodrigues

“MEDITA”

Poema indicado por: António José Salgado Rodrigues (copiado em 03-05-1956)

Autor: Fausto Guedes Teixeira

 

“Quando se chega a ver nitidamente

O erro d’uma primeira ligação,

É muito natural que toda a gente

Se dê, um dia, a outro coração.

 

Mas sempre que na vida a mulher sente

Que se enganou e aceita outra paixão,

Então, ou a conserva eternamente

Ou ela pensa que não tem perdão.

 

E é por esse motivo que, ao segundo

Amor, ela se prende como cega,

Sem com mais nada se importar no mundo.

 

É que a mulher, feliz ou desgraçada,

Não se perde na hora em que se entrega,

Mas na hora em que for abandonada.”

 

Um pouco mais sobre o autor deste poema:

Fausto Guedes Teixeira nasceu em Lamego, numa casa situada na Praça do Comércio, no seio de uma família aristocrata, filho de José Augusto Guedes Teixeira, o 1.º visconde de Guedes Teixeira, e de sua mulher Leopoldina de Queirós Guedes.

Estudou Direito na Universidade de Coimbra, convivendo ali com muitos dos intelectuais portugueses mais relevantes do tempo e com outros estudantes que também se notabilizaram na poesia. Já nessa época os dotes de Fausto Guedes provocaram duradoura admiração que o acompanharia ao longo da vida. Entre os seus companheiros e admiradores daquele tempo contam-se Augusto Gil, Afonso Lopes Vieira, Teixeira de Pascoaes e João Lúcio.

Ainda em Coimbra, fez parte do grupo de poetastros Os Polainudos, a que pertenciam, entre outros, Eugénio de Castro, Armando Navarro, Henrique de Vasconcelos, Agostinho de Campos, Alberto de Oliveira, Mendes dos Remédios e Alberto Osório de Castro. O grupo organizou em Maio de 1891, no Jardim Botânico, um outeiro poético onde foi convidada de honra Amélia Janny.[2]

Partiu para o Brasil, onde permaneceu algum tempo, e passou por Moçambique. Ao regressar a Portugal, viveu em Lisboa durante cerca de 20 anos, tendo desempenhado diversos cargos públicos e foi jornalista.

Nos seus anos finais fixou residência na sua cidade natal, onde viveu na sua Casa do Parque, onde faleceu em 1940.

O Museu de Lamego guarda o espólio pessoal da Casa do Parque, a sua residência durante os últimos vinte anos de vida, com um espólio assinalável de objectos que pertenceram a Fausto Guedes Teixeira, entregues ao Museu por disposição do próprio, em resultado da amizade que o unia ao primeiro director daquela instituição, João Amaral. Esses objectos estão em regime de exposição permanente numa sala daquela instituição.

A toponímia da cidade de Lamego inclui uma rua com o nome de Fausto Guedes Teixeira, existindo ainda um seu busto, da autoria de Costa Mota (sobrinho), no Jardim da República, em frente ao edifício da Câmara Municipal. Fausto Guedes Teixeira foi também escolhido para patrono do principal agrupamento de escolas da cidade. Também a cidades de Lisboa e de São Paulo o recordam no nome de uma das suas ruas.

Foi realizado um filme de carácter biográfico, da autoria de Paula Pinto e Patrícia Brás, com montagem de António Meireles e Adriano Guerra, que ilustra com detalhe a vida de Fausto Guedes Teixeira, enquadrando o seu percurso literário na conjuntura social e política da época. Fonte deste texto:  Wikipedia.

Clique para seguir o link e conhecer mais sobre o autor  http://pt.wikipedia.org/wiki/Fausto_Guedes_Teixeira 

Espero que tenham gostado da poesia!

Forte Abraço Albicastrense de António José Salgado Rodrigues

NÃO QUERO

Poema indicado por: António José Salgado Rodrigues (copiado em 03-05-1956)

Autor desconhecido. ( se souberem o nome do autor por favor informem)

 

“Não quero ver-te mais. De que servia?

Bem sabes que na vida nada dura.

Se vivemos uma hora de alegria,

Temos depois imensas de amargura!

 

Como às vezes após um lindo dia,

Se segue a noite, tenebrosa, escura;

Atrás dum grande Bem que nos sorria,

Vem quase sempre a dor, a desventura.

 

Eu sei que o teu amor há-de acabar,

Que as flores que me deste hão-de murchar …

A vida é toda um sonho, uma ilusão!...

 

Nada resiste ao tempo. E, na verdade,

A maior, a melhor felicidade

É sempre aquela que se espera em vão.”

 

 

Espero que tenham gostado da poesia!

Forte Abraço Albicastrense, António José Salgado Rodrigues

Vamos contribuir com as obras!

www.castelobrancomogadouro.com

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