Autor: Manuel Carlos
S. M.ª de Castelo Branco nunca foi objecto de Estudo Monográfico excepcionando um ou outro esboço de semântica evoluída que o reverendíssimo pároco Norberto de Cândido Borges na Revista de Cultura “Brigantia” publicou bem como o digníssimo e laureado Padre Aníbal Varizo, na mesma Revista, à laia de parêntesis e de somenos importância referiu.
Contudo as notícias são encorajadoras: por volta de 1920 depois de uma derrocada de terras surgiu uma 2.ª bifurcação subterrânea, perto do Orago a Santa Maria a Velha de Castelo Branco, onde encontraram moeda romana em ouro bem como variadíssimo espólio e, em consulta aos autos paroquiais (onde estão eles hoje?), tal facto já teria acontecido noutro passado de resto… e as moedas? – Perguntava-me, há uns anos, uma colega apaixonadíssima por arqueologia – Olha… são bem visíveis nas armas ou heráldica (bandeira) da nossa aldeia e dali não fogem te garanto. Mais… na década de 1980 (muitos de vós ainda estais recordados) quando se abriram os caboucos para o muro de suporte na referida capela foi novamente encontrado: moeda variada, cerâmica, telha e rocha cavada com a forma do corpo humano: almofada no lugar da cabeça, alargada nos ombros e estreitada nos pés (sepultura antropomórfica).
Nesses idos anos logo que um lavrador pontapeava um calhau “esquisito” as notícias chegavam, por via dos párocos locais, de imediato a Bragança e o Padre Manuel Alves, conhecido por Abade de Baçal, vinha logo indagar em pessoa, ele que foi e aqui lhe prestamos homenagem uma sumidade sobre a História do Nordeste Transmontano e arqueólogo de renome (ver Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança).
Dito isto, por que razão nada se fez? Obviamente que só uma intervenção arqueológica permitiria datar e compreender melhor as fases de ocupação do lugar! Vamos, então, acender a candeia e vislumbrar um pouco do nosso passado com o material disponível e fiável (toponímia).
Frei Henrique Floréz, cronista ibérico muito rigoroso a assinalar datas e locais, escreve o seguinte: “…Juliabriga estava a meia légua de Reynosa e ao seu meio dia do Elro abaixo, num alto chamado RETORTILHO onde ainda perseveravam ruínas de construções…” Em Santa Maria a Velha de C. B., junto à ribeira (da Freixeda) há também o sítio chamado de Retorta e lá no alto ainda temos as ruínas de um muito antiquíssimo castro. “Retorta” – do arcaico, é um topónimo localizado em território de povoamento em época pré-romana – relativo a um acidente de direcção de um curso de água.
Mais… as cartas militares assim descreviam o sítio em questão: “Senhora das Vilas Velhas”. Quais eram essas vilas?
-Preijal / Castelinho / Castêlo / Sr.ª da Freixeda/ Lameirões / Deveza ou Rodela. Em todos estes lugares há vestígios de um ou outro vilar muito antigo.
“Santa Maria” bem como “S. Salvador” são os cultos mais antigos da península e da cristandade que recebem os povos das civilizações pós-castrejas, indícios comprovativos de povoamento e de agricultura.
Assim, de uma assentada, temos vestígios desde o neolítico até castreja fortificação mais tarde romanizada. Isto não é difícil de deduzir pois todo o nordeste transmontano está semeado de Castros. Uns mais importantes que outros. No nosso caso, podemos afirmar que o lugar de S. M.ª a Velha de Castelo Branco serviu de “cabeça” a povos das redondezas que aqui se concentravam (…por permitir na sua topografia local as condições naturais defensivas e de abastecimento requeridos pelos castros pré-romanos e aumentando posteriormente a sua fortificação). Mais tarde criaram-se os “Vilares Novos” distinguindo-se dos vilares velhos por motivos vários e óbvias razões. O período que se segue e o que mais importância dá ao lugar é a romanização que vai permitir o desenvolvimento do antigo Castro como “Fortificação Principal” e todo o aproveitamento dos recursos naturais envolventes, introduzindo e permitindo o conceito de “Direito Privado”, logo, a criação de “novas residências ou vilares”.
É neste contexto (com os romanos) que nasce o topónimo Castelo Branco. Eu sei que os Filólogos não se entendem com a origem de Mogadouro, Zava e… mas no nosso caso é diferente. O topónimo é próprio e acusa na origem o Castro / Roque / Castelo ou fortificação. Podemos discutir <Branco> por uma questão de cortesia à volta de uns tremoços ou amendoins como aperitivo, mas num topónimo composto, em que um étimo por sujeito denota acusativo logo se justifica o adjectivo/substantivo. É minha opinião que <Branco> vem da importância do Castro em relação aos demais existentes nas proximidades e que lhe estavam ligados por pertença. Ou seja, havia que distingui-lo! Reforço mesmo que até o tipo de pedra aplicado na fortificação do castro (pedra quartzito) contribuísse ao nome. Reitero… temos sorte sendo um topónimo próprio e evidente, mais tarde, com a reconquista cristã e aproveitando todos os cultos pagãos, uma vez que eram importantes locais de peregrinação (…aproveitamento para converter estes fluxos de povos à cristandade) houve invocação a Santa Maria, daí S. M. de Castelo Branco (todas invocações a S. M.ª substituem cultos pagãos).
Muita coisa sabemos sobre os romanos mas uma razão da sua permanência na nossa terra, bem como noutros lugares da Península, se deve ao seguinte que passo a fundamentar – devido ao avanço da ciência sabemos hoje que na fundição do ferro diminuindo os óxidos logo aumenta-se o carbono e daí resulta a perfeição do aço, isto é teoricamente, na prática, os romanos sabiam que na fundição do ferro adicionando outros minerais eliminavam as impurezas (óxidos). E só com prospecção de minério e experiências poderiam confirmar qual o melhor resultado e que eles obtiveram com a mistura de Volfrâmio, minerais abundantes e riquíssimos na nossa terra. Assim poderiam obter material bélico que não enferrujava entre batalhas, mais resistente e o orgulho na sua “espada”. Castelo Branco beneficiou com os romanos bem como outras terras. Mais tarde os caminhos foram utilizados, mesmo recentemente se construíram estradas nas antigas vias romanas. Outros antigos traçados desaparecerem por circunstância de despovoamento ou outro factor. Mas foi na idade média que melhor se aproveitou, quer no traçado quer nos seus alicerces… que o digam os rendeiros dos senhores comendadores do Mogadouro que muito imposto pagaram para reaproveitar e reconstruir pontes (não de raiz) e caminhos para que os patronos fizessem “o bonito” na corte em Lisboa.
Quanto às minas que os romanos exploraram… olhem nem sei que vos diga. Mais tarde serviram de deslumbramento a meia dúzia de famílias cuja riqueza extraída lhes permitiu “comprar” um eléctrico na cidade do Porto. Hoje são os veículos todo-o-terreno antes eram os eléctricos “amarillos” que estavam na moda (humor só para albicastrenses seniores e maduros…).
Vejamos outro exemplo de romanização em S. M.ª de Castelo Branco invocando a toponímia, aliás, muito importante em arqueologia:
Vale da Cã – (lat. Canale; arcaico “cãale”; conduta de irrigações, os romanos eram exímios nas irrigações, banhos e termas, assim temos “cãal” – canal ou canalização tosca que levava água à fonte (bastante abundante no local) e depois ao chafariz da MOTRETA. Já não há quem não se lembra (?) no local haver duas condutas no terreno contíguo ao chafariz que depois de descobertas foram mais tarde arranjadas e tinham todo o aspecto das condutas que os romanos usavam nas suas estâncias ou vilas (é caso para o albicastrense dizer: em vale da cã… água sã).
Ao lermos “As Religiões da Lusitânia” de Leite Vasconcelos verificamos que antes dos romanos, já por cá eram adorados vários Deuses, por ex: Endovélico! Nas primeiras escavações arqueológicas nesse primitivo lugar e que foi a estreia para o neófito arqueólogo (no concelho do Alandroal) descobriram-se estátuas romanas em mármore de uma beleza enorme, muito raras e, mais de oitenta inscrições latinas, quem diria, num local tão ermo como S. Miguel da Mota – o que poderíamos nós encontrar em Santa Maria a Velha de Castelo Branco se tal fosse possível?
Vale de Cambra, 28 de Fevereiro de 2011.
Manuel Carlos
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