Revisitando Castelo Branco

28/06/2011

TRINDADE COELHO (18/06/861 – 9/08/908)

Autor: António José Salgado Rodrigues 

RECORDANDO UMA DATA ESQUECIDA

Já lá vão 150 anos, fê-los no dia 18 de Junho do corrente ano e lembro-me como se fosse hoje, recordava o Reitor de Meirinhos, Padre Francisco António Bernardes, em cavaqueira amena com o seu amigo José Francisco, que veio a notabilizar-se com o patronímico TRINDADE COELHO.

-Ouve lá, ó Trindade, ainda te recordas do tempo em que da janela da casa de teus pais em que tu nasceste, tocavas o sino da Igreja do Convento, chamando os fiéis à oração das Avé – Marias, convento esse onde por vezes ias a ajudar à missa, e frequentavas a Escola Régia, ali mesmo contígua àquele Convento?

- Olha que mal me recordo já , tenho mais presente quando fui para Travanca frequentar a Escola Primária e onde aprendi e passei momentos de tristeza juntamente com meu irmão, com saudades da nossa mãezinha e não esqueço as paródias que ali passei com o meu amigo Manuel, filho da velho Tomé e á custa do SULTÃO, aquele jumento que parecia entender toda a gente. Ó Padre Francisco, lembras-te de eu te contar essas peripécias, não lembras?

- Ora se me lembro, já as sei de cor, tantas vezes que reli o teu livro “OS MEUS AMORES”, assim como não esqueço os trabalhos por que passou o António Fagotes, quando o Juiz da festa da Senhora das Dores. Não te parece, ó Trindade, que naquele tempo havia mais bairrismo?

- Sabes, Padre Francisco, hoje a animação ainda é grande, mas realmente nos nossos tempos a coisa era mais de arromba embora pese o facto de hoje haver mais variedades musicais. Sabes bem que eu não podia assistir tanto quanto desejava a todas as festas, já que em 1873 fui para o Colégio do Porto prosseguir os meus estudos e quando em 1885 concluí o curso de Direito, e tive de me dedicar de alma e coração à profissão e às letras.

- A quem tu o dizes, Trindade! Os meios eram poucos e já casado e com o teu filho HENRIQUE, tiveste mesmo que abraçar a advogacia. Ainda te recordas de quem se interessou por ti para seres colocado na comarca de Sabugal?

- Ó Padre Francisco, então eu havia de esquecer esse grande romancista, o Camilo Castelo Branco, que muito lhe devo e agradeço. Mas sabes uma coisa? Mudemos de assunto, que essas recordações felizes trouxeram outras bem mais desgostosas.

- Tens razão, Trindade, foram bem melhores os tempos que passaste por Coimbra com as patuscadas estudantis e que tão bem descreves noutro teu livro, o “IN ILLO TEMPORE”; parece que essas tradições sadias já não estão tão enraizadas na estudantada.

- Sabes, Padre Francisco, os tempos foram mudando e os costumes foram-se modificando, mas a rapaziada vai tentando fazer reviver aquela sã camaradagem.

- É como em tudo, meu caro Trindade. Tu não vês que até na política ainda há coisas semelhantes? Lembras-te dos pesadelos por que passaste quando te quiseram fazer político e Deputado?

- Alto lá, ó Padre Francisco Bernardes; quiseram, não, quisestes. Não foste tu também quem manobrou e assinou aquele manifesto com mais de cinquenta assinaturas de amigos, a incentivarem-me para fazer parte e encabeçar a lista para deputado pelo concelho de Mogadouro?

- Que barafunda isso provocou, Trindade; como tu sabias bem distinguir os amigos que te rodeavam. Ainda hoje leio com saudades e parece reviver esses tempos ao ler aquele teu livro sobre esses acontecimentos, aquele a que deste o título de “A MINHA CANDIDATURA POR MOGADOURO”. Como recordo todas as trapaçarias! E aquele lavrador cá da vila que tanto gostava de ir à frente dos bois que puxavam o carro com uma chiadeira infernal – o que era proibido -, e foi ter com o administrador dizendo-lhe que lhe dava o seu voto e mais 10, se lhe deixasse chiar o carro à sua vontade! Com pouco se compravam já nesse tempo votos!!!

- Eram esses e outros factos que me atormentavam, ao saber que os meus conterrâneos se estavam a deixar dividir por causa da política e eu queria evitá-lo. As conversas que por vezes ouço a certos políticos que se passeiam neste Jardim, tentando enganar os mais incautos com a caça ao voto, prometendo o que depois não dão nem cumprem, me levam a concluir da minha razão do que escrevi. Tinha que se fazer alguma coisa para que se unissem todos os mogadourenses em torno de um só partido – o partido do concelho.

- Era esse o teu e nosso desejo, Trindade, e poucos se aperceberam que foi com essa intenção que escreveste a “PARÁBOLA DOS SETE VIMES”, e os “FOLHETOS PARA O POVO”, para lhes fazer ver que, unidos, dificilmente seriam vencidos, que a união faz a força.

- É verdade, Padre Francisco, e ainda bem que os meus e nossos compatrícios de Mogadouro me entenderam. Sabes uma coisa? E se acabássemos com tanta recordação? Nunca mais saíamos daqui.

- Dizes bem, Trindade. Desçamos à nossa vida eterna. Eu continuarei ignorado como muitos; nada fizemos digno de nota. Mas tu continuarás altaneiro nesse pedestal erguido no Jardim a que deram o teu nome – JARDIM TRINDADE COELHO - ali mesmo em frente à casa que te viu nascer no dia 18 DE JUNHO DE 1861.

MOGADOURO, l8 de Junho de 2011.

Autoria de: António José Salgado Rodrigues)

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