Autor: Isaias Cordeiro
Quase quarenta anos depois ! Sim, digo bem, quase, porque muito pouco falta ou não fossem trinta e nove os anos que distam para me situar em terras bem longínquas do nosso cantinho Europeu. Disso já fiz referência em artigos anteriores e é bem sabido por muita gente alguns dos locais por onde passei numa guerra que neste artigo não vou comentar. Decorrem actualmente na imprensa escrita e televisionada fascículos ou imagens bem lícitas daquilo que foi realmente a guerra nas então Províncias Ultramarinas.
É verdade que elas referem por norma as passagens globalmente ocorridas, aqui e ali uma ou outra individualizada e nessas pouco ou nunca referindo o papel que muitos homens desempenharam num misto de evangelização, espalhando amor e amizade pela conciliação em troca das armas que a ambas as partes geravam grande sofrimento.
Dos meus apontamentos manuscritos relato inúmeras passagens durante três anos os que antes disse fazer parte das trezentas páginas guardadas mas mal arrumadas.
No caso presente servi-me da minha CADERNETA DE REGISTO DE SERVIÇO AÉREO DE TECNICOS ESPECIALISTAS na qual se encontram registadas muitas missões que efectuei enquanto Mecânico dos ALL III.
No dia catorze de Dezembro de 1972 bem próximo da quadra que mais gosto e durante a tarde eu e o meu amigo Mogadourense Luis Branco Piloto Aviador descolamos para mais uma missão, esta sem tempo definido mas que se prolongou dada a sua especificidade. Já nesse dia tínhamos efectuado algumas horas de voo em operações em Chizampeta e Furancungo. Uma passagem pelo AB7-TETE-Moçambique e após um hora e vinte minutos estávamos numa unidade Militar em FINGOÉ algures no Distrito de Tete.
Aterramos num improvisado campo de futebol e á nossa espera estavam vários militares, alguns oficiais, um sargento ajudante e uns soldados que já de G3 na mão iriam guardar o Helicóptero. Troca de cumprimentos, saco de viagem na mão e lá fomos para o local onde seriamos instalados. Passamos pelo bar de Sargentos, refrescámos com uma Laurentina ,no meu caso pessoal a cerveja preferida entre as disponíveis e como de costume uma conversa amena com os presentes tendo o ajudante, um homem já tarimbado ou não tivesse ele já três comissões efectuadas, feito uma súmula dos acontecimentos na zona descrevendo uma a uma as emboscadas, minas, ataques a colunas militares, aldeias e o mais dramático os mortos e feridos havidos por toda aquela zona.
Depois de jantar lembrei-me de ir até ao bar de soldados beber um copo. Lembro bem, um pavilhão tendo ao fundo um balcão com muitos soldados a conversar. No centro uma mesa de matraquilhos cujos punhos originais já tinham dado lugar a uns, perdoem-me a expressão, feitos á machadada mas que em nada alterava a vivacidade e o vibrar com os golos que cada equipa marcava. Aproximei-me deste grupo tendo já como sempre fazia pelos destacamentos onde passei, preparada a pergunta habitual, aproveitei um fim de jogo, pedi desculpa pela intromissão e perguntei se havia Trasmontanos na companhia. Um dos presentes viu que pela minha pergunta também eu o devia ser. Respondeu sim, temos muitos na companhia eu próprio também sou.
Um a um foram-me rodeando dizendo, sou de Chaves ,estes dois são de Boticas aquele além é de Vila Pouca e há alguns de Vila Real. Na verdade fiquei um pouco triste, não havia conhecidos nem tão pouco eu conhecia as terras por eles referidas. Aproximei-me do balcão ,um soldado já tinha na mão um cerveja para me dar. É para si, disse ele. Agradeci e ali ficamos falando da guerra e do nosso trabalho, respondi ás suas perguntas curiosas sobre os Helicópteros, enfim um pouco de tudo.
Decorrido algum tempo vieram alguns militares ter comigo. Um deles já próximo do balcão perguntou. Quem é que procurou por Trasmontanos? Um soldado antecipou-se e respondeu, é o mecânico do Helicóptero meu Tenente. Depois de um aperto de mão o oficial perguntou-me de onde era. Para não complicar como acontecera algumas vezes respondi, de Mogadouro senhor Tenente. Respondeu, conheço bem pois sou de uma aldeia desse concelho. Já mais satisfeito com este encontro referi que não era de Mogadouro propriamente mas sim de Castelo Branco desse concelho embora tivesse ido para Lisboa alguns anos atrás e por lá ser recenseado para a Força Aérea. Dessa terra sou eu mas não sei de quem és, diz lá! Sou filho do Adérito Cordeiro, já falecido e Idalina Neto. Deu-me um grande abraço, disse, és o Isaías e lembrou, a tua mãe ajudou a fazer o banquete da Festa da Missa Nova. Não sabia nada de ti nem esperava encontrar-te aqui. Que grande alegria encontrar um conterrâneo bem longe do nosso Castelo Branco onde. Era o ILUSTRE PADRE ORLANDO MARTINS !
Deste meu destacamento faziam parte entre outros o transporte do senhor Padre Orlando a várias aldeias numa missão Evangelizadora, de Paz e dialogo com esses Povos. Não tenho presente o nome dos locais visitados já que nos meus registos militares estes estão designados como “ZOPS “ mas tenho bem presente estas passagens.
Por curiosidade faço referência a óptimas condições desse Quartel no Fingoé, muito acima da média de todos por que passei em Moçambique que foram muitos.
Não conheço toda a obra do nosso Missionário Albicastrense, O Excelentíssimo Senhor Vigário Episcopal Padre Orlando Martins recentemente nomeado pelo Arcebispo de Luanda para a Educação. A sua obra na Paróquia de Santa Ana em Luanda, esta que possui uma elevada densidade populacional é a prova da total dedicação á causa do Próximo. Igrejas e escolas construídas, a alfabetização e saúde são disso o exemplo.
Não tenho dúvidas do seu trabalho, da sua obra e da sua capacidade. Os Conterrâneos Albicastrenses devem sentir-se orgulhosos pelo Missionário, pelo Homem e pela sua obra. È tempo de o Homenagear !
Da minha parte estou disponível para qualquer iniciativa nesse sentido.
Um grande abraço para todos.
Isaías Cordeiro
2010.06.24
Obs: A Foto anexa foi-me gentilmente oferecida pelo Gualdino Rentes. No primeiro andar da antiga casa dos pais e na sua companhia o senhor Padre Orlando saúda os presentes que lhe dão os parabéns pela sua Missa Nova.
Em baixo lado esquerdo é Isaías Cordeiro, a razão da oferta desta foto. A minha mãe está lá dentro colaborando no banquete.
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